O pecador a Jesus
Ode mística do P. J. Verdaguér –
Mimo deliciosamente espiritual,
exemplar singularíssimo de lirismo religioso)
(Acto de contrição da alma arrependida)
Cada manhã que vem, eu vos adoro;
Mas ao cair o sol, já vos deixei:
Quem chorará, Jesus, quando eu não choro,
Tão infeliz que nunca vos amei!
Eu, que amor derramava com fartura,
Tão pouco (ai!) para vós soube guardar:
As pálpebras fechava, ó Formusura,
Para assim vos não ver e não amar.
Destes-me um coração; de terra enchi-o,
E d’arma em punho vos mandei sair:
Puséreis-lhe asas de aguia; foi seu brio
Voar longe de Vós, de Vós fugir.
Regato que a brincar vai nos caminhos,
Nunca sonhei vê-lo parar por fim;
Do mundo nos sarçais buscando espinhos,
Deixei-vos, Flôr do divinal jardim.
E hoje que me acolheis, e em vossos braços,
Porque não fuja, me prendeis por bem,
d’estes beijos m’esquivo e d’estes laços;
Minha alma ainda no mundo o ninho tem.
E ao escutar seus cantos de sereia,
Quando á fonte do amor me trouxe a fé,
Dos pecados religo-me á cadeia
Que me prendeu dos vícios na galé.
Eu, cru de coração, faço-vos guerra
Encastelado em meu arnês de pó;
E não me traga, ó bom Jesus, a terra?
E ainda respirar me ouvis com dó?
Tinto de sangue e lagrimas, qual rosa,
Bater-me às portas da alma eu vos ouvi:
«Abre (dizendo) oh! Abre-me, formosa,
«Que nas justas de amor lutei por ti.
«Trinta e três anos te busquei perdida,
«Do meu presépio à cruz, longe do céu,
«Á cruz em que deixei armas e vida
«Com teus grilhões pendentes por troféu.»
Doce Mártir de amor, tomai a palma,
Que de render-me a Vós é hora já.
Se vos cuspiu, vendeu, cravou … esta alma
Como nodoas tão negras lavará?
Meu coração não tem sanguíneo choro,
Seráficos incêndios não tem, não:
Canções ensaio do celeste coro!
Mas as que eu sei, da terra todas são.
Ah! Se mundana é de meu peito a lira,
As cordas de ouro quero-lhe arrancar;
E, se por aí que Vós, canta ou suspira,
Também do amor a corda hei-de quebrar.
De minhas culpas já perdi a conta:
Vós que a tendes escrita, oh! Consenti
Que vossos pés abrace; pronta, pronta
Minha alma os banhará gemendo aqui.
Sobre eles vazará o fino aroma
Com que as tranças usavam rescender,
E na vaidosa desgrenhada coma
Enxugará os prantos que verter.
Saboreie João vossos abraços!
Mas, outra Madalena, eu pecador,
Que me arredei dos amorosos braços,
A vossos pés quero morrer de amor.
(traduzido do orig, catalão, por J. Serafim Gomes)
(Aprovado pela autoridade eclesiástica.
Comentários
Enviar um comentário